quarta-feira, junho 29, 2011

A caminho de um Direito da Saúde Europeu


União Europeia tem vindo a desempenhar um importante papel no domínio do Direito da Saúde, em especial do Direito da Farmácia e doMedicamento e na área da Saúde Pública.
Nos últimos anos, a Europa da livre circulação de pessoas e da livre prestação de serviços vem enfrentando um novo desafio: o da protecção dos direitos dos pacientes e os desafios da criação de um “mercado europeu da saúde”, sem prejuízo dos equilíbrios dos sistemas nacionais de saúde. Nesse sentido foi aprovada, em Março passado, a Directiva 2011/24/UE de 9 de Março de 2011 relativa ao exercício dos direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços, que vem permitir aos cidadãos de um Estado membro aceder aos cuidados de saúde noutro Estado, embora sujeito a várias restrições, como o sistema de autorizações prévias e ao facto de a obrigação de reembolsar os custos dos cuidados de saúde transfronteiriços ser limitada aos cuidados de saúde aos quais a pessoa tem direito nos termos da legislação do seu Estado-Membro de afiliação.
Mas a União Europeia ocupa-se já também das questões da bioética, desde logo porque a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, incorporada no Tratado de Lisboa, consagra os direitos fundamentais, com especial relevo “no domínio da medicina e da biologia: i) o consentimento livre e esclarecido da pessoa, ii) a proibição das práticas eugénicas, nomeadamente das que têm por finalidade a selecção das pessoas, iii) a proibição de transformar o corpo humano ou as suas partes, enquanto tais, numa fonte de lucro, e iv) a proibição da clonagem reprodutiva dos seres humanos.” (art. 3, n.º2)
Apesar deste conjunto de princípios comuns, seria hipócrita negar que subsistem fortes divergências bioéticas entre os países europeus, em diversas matérias, em especial o estatuto dos embriões e o fim de vida. Essas divergências e contradições irão persistir ainda durante algum tempo, o que aliás enriquece o projecto europeu e constitui uma mais-valia do velho Continente. Se na Suécia o estudo das células estaminais se pode fazer com base em embriões humanos, já a Alemanha ou a Irlanda irão apostar mais fortemente nas células estaminais de adultos ou do cordão umbilical. Se na Holanda, Bélgica e Luxemburgo se desenvolve o cuidar em fim de vida, tendo como horizonte a possibilidade da eutanásia, já em muitos outros países se desenvolve uma prática e uma ética baseada noutros valores e compromissos.
Registe-se que uma outra organização, o Conselho da Europa, encontra no domínio da bioética um campo privilegiado de acção para a protecção dos Direitos Humanos, sendo de destacar a aprovação, em 1997, da Convenção sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina, que está em vigor em Portugal desde 2001.
Vemos assim que também no domínio da prestação de cuidados de saúde e num conjunto de princípios éticos fundamentais no domínio da biomedicina, o debate é cada vez mais europeu, pelo que urge a formação de uma opinião pública informada e participativa para a formação de um consenso possível e sobretudo para não aceitar acriticamente qualquer forma de colonização “bioética” ou de concepção estrangeira de modelos de saúde.