segunda-feira, março 26, 2007

Salazar ganhou.

Salazar obteve 40% dos votos no concurso/passatempo da RTP. Cunhal ficou lá perto.
Votaram cerca de 210.000 pessoas, rectius, telemóveis.

Ao contrário do que disseram alguns comentadores na televisão, penso que este voto não se reduz a um simples “voto de protesto”!
Foi, na sua maioria, um voto de convicção!
E temos que saber conviver com isto!

Isto significa que, em Portugal, em 2007, e seguindo a sagesse de Monsieur de La Palisse:
1) Há salazaristas;
2) Há dezenas de milhar de salazaristas;
3) Esses concidadãos puderam exprimir a sua opinião neste concurso…

A pergunta seguinte parece ser: e onde encontramos no espectro político-partidário actual estes cidadãos-eleitores?
Porque razão nenhum partido procura apropriar-se directamente deste património político e potencial eleitoral? Será a proibição, constante da Constituição da República de 1976, de apologia do fascismo e de constituição de partidos fascistas, que o justifica? Será legítimo manter esta proibição?
Ou, por outra, deveria a televisão pública admitir Oliveira Salazar, o Déspota de Santa Comba, como concorrente?

Ou será que os partidos da direita dão guarida a este eleitorado e a este projecto político?
Freitas do Amaral relata nas suas “Memórias” que alguém lhe oferecera os ficheiros dos “bufos” da PIDE para ele lançar rapidamente o seu CDS. Ele recusou. Sá Carneiro aceitou…
Estará algum bufo a ler este texto neste momento?
Estará algum bufo na Assembleia da República como Deputado?
No CDS não parece que esteja, já que todos os Deputados são tão jovens e agora com a camisa aberta, como o seu passado e eventual futuro líder…
Mas, quiçá, nas bases ou na estrutura do CDS? E do PSD? Ou mesmo do PS?

E porque razão Manuel Monteiro não consegue cativar estas dezenas de milhar de concidadãos?

Serão estes eleitores todos descendentes das famílias que lucraram com a guerra colonial?
Ou das famílias que beneficiavam do regime de condicionamento industrial? (Querem maior corrupção que esta!!!!!!)
Ou os “despojados” do ultramar, que odeiam a Revolução de Abril e a descolonização? Ou estarão entre os salazaristas também pessoas que não gostam da democracia? Da liberdade de expressão? De um Portugal mais europeu que se está a criar?

Algumas interrogações, mas uma certeza: eles são uma minoria!
A votação não terá ultrapassado os 210.000 telefonemas, segundo ouvi Maria Elisa dizer. Os salazaristas/ fascistas não passam dos 100.000. São menos que os eleitores do CDS.

A maioria dos portugueses manteve-se relativamente indiferente ou pelo menos entendeu não gastar um tostão neste concurso.
Fizeram bem!
O meu preferido, Infante D. Henrique, perdeu… Mas vou dormir tranquilo!
Até amanhã, Camaradas!

domingo, março 25, 2007

Por uma Europa forte e unida!

Uma Europa forte e unida é condição de equilíbrio e progresso de toda a humanidade.
Uma força cultural, política, económica e militar que se bata por progressos no domínio do ambiente, dos direitos sociais e pelo diálogo de civilizações.

quarta-feira, março 14, 2007

Os Grandes Portugueses

Este programa da RTP (originário da BBC) tem vindo a ser criticado em diversos quadrantes, especialmente por alguns historiadores e intelectuais.

Identifico algumas correntes dentro dessa crítica.

Uma primeira seria a “critica da inveja”: critica-se a qualidade dos apresentadores, acusando-os de não serem especialistas e de cometem erros grosseiros… Fica subentendido que estes críticos gostariam de ser eles prórpios os apresentadores…

Outra corrente, que classificaria como a “critica do costume”: “lá está a televisão a fazer mau serviço público, a destruir aquilo que até seria uma boa ideia, desde que feita de uma “outra maneira””… Ficamos sempre sem saber ao certo a que “outra maneira” se referem. Mas sabemos, que tocando nos seus domínios da História e da cultura, estes críticos não poderiam ficar calados...

Uma terceira é mais séria. É uma crítica ideológica e metodológica e portanto mais legítima e mais respeitável. Partindo do marxismo e do estruturalismo (dominantes na historiografia do século XX) vêm dizer, como José Manuel Pureza, na Antena 1, que grandes portugueses são todas as mulheres e homens que se levantam às 6 da manhã para apanhar o transporte e ir para os seus trabalhos, etc., etc. Que a História é feita pelo colectivo, por processos dinâmicos, etc., etc. Enfim, todo o discurso de a minha geração foi vítima nos estudos liceais onde aprendemos uma História (quase) sem rostos, com o mínimo de Reis e de heróis, mas com muitos “factores”, “dinâmicas”, infra-estruturas”, “supra-estruturas”, “demografia”, “economia” e “sociedade”…. O que tem inegáveis vantagens e méritos, mas que – sozinha – resulta algo ‘asséptica’ ou sem cor. Há lugar para os grandes homens e mulheres. Há pessoas que fazem a diferença (Afonso Henriques, Vasco da Gama), que indicam o caminho (Infante D. Henrique, Marquês de Pombal), que nos oferecem a consciência moral do que somos enquanto povo e nação (Camões, Pessoa). Só por preconceito ideológico se pode negar esse facto.

Incomoda muita gente, e a mim também, que nas 10 figuras em análise conste o Ditador de Santa Comba e o fiel agente de Moscovo.
Mas vejamos pela positiva: não temos princesas, nem rainhas da moda. Nem sequer futebolistas (por muito mérito que lhes reconheça) – e nem todos os países se podem orgulhar deste registo…
É pena não encontrar cientistas (embora, para mim, o Infante D. Henrique seja o grande “organizador de ciência e tecnologia”), ou sequer uma mulher. Mas é o fruto da História que se foi ensinando e vivendo desde que os “votantes” estão vivos.

Numa palavra: os programas que vi até agora (só alguns) foram interessantes, estimulantes e agradáveis. Aprendi mais qualquer coisa e fiquei curioso por saber mais. Acho que a TV pública cumpriu o seu papel naquele bocado de serão. Só a isso está obrigada.
O programa tem, pelo menos, uma virtude: pôs-nos a reflectir um pouco sobre a nossa identidade, a nossa História e as pessoas que, em vários domínios, da política, à ciência, à literatura, foram marcando a diferença no nosso Portugal e no Mundo.

Os intelectuais da desgraça que não desanimem. Certamente depois deste programa haverá outros que poderão alegremente (embora com ar abatido e desolado) criticar…

terça-feira, março 13, 2007

A interrupção voluntária da gravidez

(texto escrito em 3 de Fevereiro de 2005)


A legislação relativa à IVG resulta, na sua estrutura fundamental, de uma Lei de 1984. Nesse diploma a AR descriminalizou a IVG, quando realizada com o consentimento da mulher, sob direcção de um médico e em estabelecimento de saúde oficial (ou oficialmente reconhecido) em certas circunstâncias. Estas, resumindo, são as seguintes: a indicação terapêutica (a IVG tem em vista evitar a morte ou grave e duradoura lesão para o corpo ou saúde física e psíquica da mulher), a indicação fetopática (quando se detecte que o feto virá a sofrer de doença grave e incurável ou de malformação congénita grave) e a indicação criminológica (no caso de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual da mulher). Por vezes a lei impõe prazos (de 12, 16 ou 24 semanas), por vezes pode ser realizada em qualquer fase da gravidez: quando constituir o único meio de remover perigo de morte ou de grave e irreversível lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida ou quando o feto seja inviável.
Em todos os outros casos em que a mulher decida abortar, o Código penal ordena a sua punição com prisão até 3 anos.
Na generalidade dos países europeus e norte-americanos a situação é diversa, tendo-se descriminalizado a IVG quando realizada a pedido livre e esclarecido da mulher grávida, realizada por um médico em centro de saúde autorizado e desde que dentro das primeiras 10 ou 12 semanas de gravidez. Visa-se, entre outros objectivos, lutar contra o aborto clandestino, trazendo as mulheres para o sistema de saúde, de forma a se lhe poder proporcionar assistência e acompanhamento na sua saúde sexual e reprodutiva. Uma solução semelhante foi já aprovada no nosso Parlamento, mas acabou por ser derrotada, por margem mínima, no Referendo de 1998.
Na próxima legislatura voltaremos, todos nós, eleitos e eleitores, a ter que nos pronunciar sobre a matéria. Tenho para mim que o modelo vigente não é o mais adequado: tem criado desigualdades e injustiças sociais, descrédito do sistema judicial e não promove uma verdadeira educação para a saúde sexual e reprodutiva. E nem parece que tenha permitido evitar o recurso à IVG.
O que está em causa no debate sobre a descriminalização da IVG até às 10 semanas não é reduzível às fórmulas simplistas: “ser a favor da vida” ou “o embrião é propriedade da mulher”. Todos concordamos que o embrião merece respeito e protecção jurídica. Todavia, a decisão de interromper a gravidez é e será sempre extremamente dolorosa e profundamente dramática para uma mulher e urge criar todas as condições para que ela possa exercer na plenitude a maternidade. Contudo, se não é essa a sua possibilidade ou a sua vontade, a intervenção do sistema policial e judicial não parece justificada, causando mais prejuízos que benefícios.
As causas do aborto devem ser combatidas a montante. Devemos apostar na educação para a sexualidade e deveremos criar uma sociedade mais fraterna e mais solidária em que cada mãe e cada casal tenha as condições económicas e sociais para educar uma criança. Descriminalizar a IVG, nas condições propostas, não significa ‘liberalizar’ ou ‘banalizar’ esse comportamento tão penoso para a própria condição da mulher. Trata-se de tratar com humanidade as mulheres que se encontram em situação tão dolorosa. Simultaneamente julgo criticável a publicitação desta actividade. Aliás, em alguns países, como a Alemanha, é proibida a publicitação, bem como a obtenção de qualquer lucro com esta actividade. Estes e outros assuntos, como a inserção de um prazo de reflexão de 3 dias ou o acesso obrigatório a uma consulta de apoio psicológico e social, deverão ser debatidos na especialidade no momento da elaboração de um diploma na Assembleia da República.
Para já o que as portuguesas e os portugueses terão que reflectir para em breve se pronunciarem em Referendo é se deveremos manter uma punição injusta, discriminatória, que não está a dignificar a condição da mulher nem sequer a proteger o direito à vida, que todos sinceramente defendemos.

segunda-feira, março 12, 2007

Criança para sempre

Denise Dweck:

A dramática decisão dos pais: interrompero crescimento da filha deficiente parapoder cuidar melhor dela

Agora, há um novo e surpreendente limite: a interrupção do crescimento de uma criança deficiente para que ela permaneça pequena e possa receber cuidados com mais facilidade. Ashley, uma americana de 9 anos, sofre de encefalopatia estática, doença que provoca retardo mental profundo. O desenvolvimento mental de Ashley parou aos 3 meses de idade. Ela não fala, não anda e não se senta. Depende de ajuda para tudo e alimenta-se por tubos. Quando a garota começou a apresentar sinais de puberdade precoce, há três anos, os pais se questionaram sobre como seria cuidar da filha quando ela fosse maior, mais pesada e iniciasse seu ciclo menstrual. Antecipando as dificuldades para carregá-la, optaram por um tratamento radical: os médicos restringiram o crescimento de Ashley com altas doses de hormônio, removeram seu útero e retiraram suas glândulas mamárias para evitar o desenvolvimento dos seios. Com isso, a menina não vai mais crescer (ela tem 1,34 metro de altura e 30 quilos), mas seu rosto será o de uma adulta.
O tratamento tornou-se público com a publicação de um artigo numa revista médica. Em um blog criado na semana passada para explicar a decisão, os pais, sem se identificar, alegam que fizeram o tratamento para dar melhor qualidade de vida à filha. Eles explicam que a retirada dos seios e do útero evita a possibilidade de ela ser vítima de abuso sexual e engravidar. O que para os pais foi uma decisão fácil, como afirmam no site, é um caso sem precedentes e recheado de dilemas éticos. Até que ponto os pais podem modificar de maneira irreversível o corpo de uma criança a pretexto de protegê-la de problemas hipotéticos no futuro? O tratamento de Ashley, por seu ineditismo, passou pelo crivo do comitê de ética do Hospital de Crianças de Seattle. "Para darmos o aval, fizemos questão de assegurar que Ashley nunca sairia da condição em que estava", disse a VEJA Doug Diekema, diretor do Centro Treuman Katz para Bioética Pediátrica, de Seattle. Uma das críticas feitas aos pais de Ashley é que, ao acreditarem na premissa de que a função da ciência é melhorar a qualidade de vida das pessoas, eles partiram do pressuposto de que é justificável recorrer a qualquer medida médica para atingir o que consideravam o melhor para a filha. "Submeter uma criança a anestesia geral para a retirada das glândulas mamárias e do útero, por exemplo, é um procedimento de risco para uma finalidade pouco clara", diz o cardiologista Reinaldo Ayer, coordenador da Câmara Técnica Interdisciplinar de Bioética do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo. "O mais indicado é tratar os problemas à medida que eles vão aparecendo."



Um caso bem complicado para começar o dia....

Tenho muitas dúvidas sobre a justificação desta intervenção tão radical.
Como primeira aproximação, parece-me que é o paternalismo médico e a obstinação terapêutica que rientam esta decisão: isto é, em nome de evitar males futuros, tomam-se medidas radicais já. Quase faz lembrar a guerra preventiva...

Acredito que a criança nunca viesse a ter consciência do seu corpo e da sua identidade, pelo que lhe seria aparentemente indiferente ter corpo de menina ou de mulher, mas fica a dúvida. Será que negámos a este ser humano o direito ao desenvolvimento da personalidade, embora neste caso seja uma personalidade meramente física ou corporal?
No plano social, será legítimo permitir criar seres com corpo infantil? Não afecta isso a própria imagem da espécie humana, enquanto ser para o envelhecimento e ser para a morte?

Ficam esta dúvidas....